sexta-feira, 9 de março de 2012

OLHOS DE DIAMANTE

Não me incomoda o
Ruído prolixo & estrídulo das cidades
Tanto quanto a conversa sem nexo
Dos transeuntes
(Antes me irritam até a neurastenia
Todas essas bocas abertas arrulhando
Como pardais sem asa).

O ruído escandaloso das máquinas, engrenagens, frenagens & buzinas
O frenesi dos armazéns, do atacado & varejo,
Descarregar contínuo de mercadorias, sim
Me agrada
Até a náusea &
Mantém minha atenção inatacada.

Sim, os realejos
Anúncios de ofertas, de igrejas
Promoções, a fumaça branca das indústrias & olarias,
Os açougues & botecos onde os homens expõem a carne
& perdem a alma,
O vapor das moegas, engenhos,
A água-ardente ao lado dos ébrios
No santuário de vagabundos chamado praça pública
& nas esquinas.

Não me sinto
Bem dentro de mim, &
Lá fora me sinto
Séculos melhor:
Quero então que todos os poetas ressuscitem
& vão à merda!

Procuro-me, silente, no
Contemplar a água
Cinzenta que sacia as bocas
De lobo porque elas não mordem
Meu alheamento.

Aliás, todo alheamento
Agrada-me até
A profundidade metafísica
Não aquela dos narcóticos & inseticidas
Que matam meus irmãos (somos mesmo irmãos?)
Como baratas.

& o não estar em mim
Reconduz-me a minha estrela predileta:
O adivinhar os detalhes
Do teu corpo noturno
Nos detalhes de todas as mulheres:
“E verás Helena em toda mulher”
(Mas teu nome não é Helena)
Teu nome é qualquer nome, qualquer sentença,
Nesse transe pisoteado pelos vagabundos
Onde mãos sem braços
Trafegam pelo ar
Fazendo gestos
Obscenos
Que me acenam dos bueiros
De onde brotam
Aos borbotões (borbulhando)
Miríades de ratos
De olhos de diamante.

02-03-2012